terça-feira, 30 de junho de 2009

POESIA DE RUI BARBOSA



Nesses tempos de corrupção terceirizada, de escândalos que não são tratados mais como novidade, publico uma poesia, que recebi de um amigo, do grande político e jurisconsulto Rui Barbosa (1849/1923). Apesar de escrita a décadas essa poseia retrata o atual estado da política no Brasil.

SINTO VERGONHA DE MIM

Sinto vergonha de mim…
por ter sido educador de parte desse povo,
por ter batalhado sempre pela justiça,
por compactuar com a honestidade,
por primar pela verdade
e por ver este povo já chamado varonil
enveredar pelo caminho da desonra.
Sinto vergonha de mim
por ter feito parte de uma era
que lutou pela democracia,
pela liberdade de ser
e ter que entregar aos meus filhos,
simples e abominavelmente,
a derrota das virtudes pelos vícios,
a ausência da sensatez
no julgamento da verdade,
a negligência com a família,
célula-mater da sociedade,
a demasiada preocupação
com o “eu” feliz a qualquer custo,
buscando a tal “felicidade”
em caminhos eivados de desrespeito
para com o seu próximo.
Tenho vergonha de mim
pela passividade em ouvir,
sem despejar meu verbo,
a tantas desculpas ditadas
pelo orgulho e vaidade,
a tanta falta de humildade
para reconhecer um erro cometido,
a tantos “floreios” para justificar
atos criminosos,
a tanta relutância
em esquecer a antiga posição
de sempre “contestar”,
voltar atrás
e mudar o futuro.
Tenho vergonha de mim
pois faço parte de um povo que não reconheço,
enveredando por caminhos
que não quero percorrer…
Tenho vergonha da minha impotência,
da minha falta de garra,
das minhas desilusões
e do meu cansaço.
Não tenho para onde ir
pois amo este meu chão,
vibro ao ouvir meu Hino
e jamais usei a minha Bandeira
para enxugar o meu suor
ou enrolar meu corpo
na pecaminosa manifestação de nacionalidade.
Ao lado da vergonha de mim,
tenho tanta pena de ti,
povo brasileiro !
***
” De tanto ver triunfar as nulidades,
de tanto ver prosperar a desonra,
de tanto ver crescer a injustiça,
de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus,
o homem chega a desanimar da virtude,
a rir-se da honra,
a ter vergonha de ser honesto “.

(Rui Barbosa)

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Democracia de papel, cidadão de papel e plástico



Eleições passam, governos se estabelecem, partidos caem, outros assumem o poder e tudo continua do mesmo jeito. Aqui, acolá,, em qualquer canto desse imenso Brasil, as mudanças nas formas de administrar os bens públicos sofrem mudanças insignificantes, e as velhas/novas formas de poder e mando resistem, por mais que promessas sejam feitas nas eternas campanhas políticas.
Não é preciso ser um “expert” em história para se entender que a velha democracia idealizada pelos antigos gregos, sofre mutações cíclicas, desde aquela idealizada só para os chamados cidadãos até a nossa elaborada por “representantes do povo” e registrada em papel para ser seguida por todos, mais que está a serviço apenas de alguns. E assim temos constituição federal e estadual, lei orgânica, códigos e mais códigos escritos em papel para cidadãos de papel e plástico.
Por conseguinte, basta observar as transgressões constantes e cotidianas perpetradas pelos dirigentes que, no papel é passível de punição, mas que se tornaram tão rotineiras que é visto como se fosse lícito e normal. É carro púbico, ou locado, pago com dinheiro público, rodando nos finais de semana, visto em festas, utilizado para passeios, é o público se confundindo com o privado, ninguém sabe o que é propriedade particular ou propriedade pública, combustível pago com recurso público colocado em carros particulares à luz do dia, máquinas públicas utilizadas em propriedades particulares entre outras ações consideradas normais, pois de tão rotineiras se tornaram “lícitas”, aos olhos do poder e do povo.
Denuncias veladas existem aos montes, se fala em todas as esquinas desse imenso burgo que é o país, nas mesas de bares, nas alcovas, nas rodas de amigos e inimigos se fala tanto em propina cobrada para se liberar um pagamento, quanto em grandes somas pagas na execução de grandes e pequenas obras, como também em superfaturamento, aquisição de produtos escolares de péssima qualidade por preços elevados, funcionários fantasmas, os chamados marajás entre tantas formas ilícitas e transgressoras da nossa democracia de papel.
Não é novidade, nesse país que emprega empregadas domésticas como assessoras parlamentares ou secretárias só para receber proventos provenientes do erário publico, que privilegia os amigos de todos os reis como disse com pouca “moral”, mas com propriedade, um certo parlamentar, que todos os papéis, onde estão escritos os nossos direitos e deveres, são rasgados diuturnamente, jogados no lixo, principalmente quando são para beneficiar aqueles que exercem o poder ou aqueles poderosos por força do dinheiro.
Por isso, uma carteira de identidade, um CPF, o cartão de aposentadoria entre outros números que nos identificam, não nos transformam em cidadãos plenos de direitos, mas em cidadãos de papel e plástico, pois não somos e nunca seremos iguais em deveres e direitos enquanto essa democracia não sair verdadeiramente do papel e ganhar as ruas desse país.
Enquanto isso, no Senado Federal:
Quentinhas fornecidas por restaurante chique pagas com verba indenizatória;
Filhos, noras, cunhados, netos, primos de presidente são nomeados através de atos secretos;
Auxiliomoradia é pago a parlamentares que tem residência em Brasilia;
Ligações residenciais são pagas pelo Senado(208 mil reais);
ATOS SECRETOS ATOS SECRETOS ATOS SECRETOS ATOS SECRETOS ATOS SECRETOS ATOS SECRETOS ATOS SECRETOS ATOS SECRETOS ATOS SECRETOS
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segunda-feira, 22 de junho de 2009

SENTENÇA DE UM JUIZ




Recebi, atraves de e-mail, a sentença de um Juiz que, parece engraçada, mas na verdade, a coragem do magistrado e sua consciencia transparecem. Ah! o e-mail foi enviado por Nana Lisboa e, peço licença para compartilhar com os leitores do blog.

Esta aconteceu em Minas Gerais (Carmo da Cachoeira).
O juiz Ronaldo Tovani, 31 anos, substituto da comarca de Varginha, ex-promotor de justiça, concedeu liberdade provisória a um sujeito preso em flagrante por ter furtado duas galinhas e ter perguntado ao delegado: “Desde quando furto é crime neste Brasil de bandidos?”
O magistrado lavrou então sua sentença em versos:


No dia cinco de outubro
Do ano ainda fluente
Em Carmo da Cachoeira
Terra de boa gente
Ocorreu um fato inédito
Que me deixou descontente.

O jovem Alceu da Costa
Conhecido por “Rolinha”
Aproveitando a madrugada
Resolveu sair da linha
Subtraindo de outrem
Duas saborosas galinhas.

Apanhando um saco plástico
Que ali mesmo encontrou
O agente muito esperto
Escondeu o que furtou
Deixando o local do crime
Da maneira como entrou.

O senhor Gabriel Osório
Homem de muito tato
Notando que havia sido
A vítima do grave ato
Procurou a autoridade
Para relatar-lhe o fato.

Ante a notícia do crime
A polícia diligente
Tomou as dores de Osório
E formou seu contingente
Um cabo e dois soldados
E quem sabe até um tenente.

Assim é que o aparato
Da Polícia Militar
Atendendo a ordem expressa
Do Delegado titular
Não pensou em outra coisa
Senão em capturar.

E depois de algum trabalho
O larápio foi encontrado
Num bar foi capturado
Não esboçou reação
Sendo conduzido então
À frente do Delegado.

Perguntado pelo furto
Que havia cometido
Respondeu Alceu da Costa
Bastante extrovertido
Desde quando furto é crime
Neste Brasil de bandidos?

Ante tão forte argumento
Calou-se o delegado
Mas por dever do seu cargo
O flagrante foi lavrado
Recolhendo à cadeia
Aquele pobre coitado.

E hoje passado um mês
De ocorrida a prisão
Chega-me às mãos o inquérito
Que me parte o coração
Solto ou deixo preso
Esse mísero ladrão?

Soltá-lo é decisão
Que a nossa lei refuta
Pois todos sabem que a lei
É prá pobre, preto e puta…
Por isso peço a Deus
Que norteie minha conduta.

É muito justa a lição
Do pai destas Alterosas.
Não deve ficar na prisão
Quem furtou duas penosas,
Se lá também não estão presos
Pessoas bem mais charmosas.

Afinal não é tão grave
Aquilo que Alceu fez
Pois nunca foi do governo
Nem seqüestrou o Martinez
E muito menos do gás
Participou alguma vez.

Desta forma é que concedo
A esse homem da simplória
Com base no CPP
Liberdade provisória
Para que volte para casa
E passe a viver na glória.

Se virar homem honesto
E sair dessa sua trilha
Permaneça em Cachoeira
Ao lado de sua família
Devendo, se ao contrário,
Mudar-se para Brasília!

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Das injustiças cometidas no cotidiano e das crises existenciais


Por mais que não queiramos enxergar a realidade ou vendar os olhos para as verdades que teimam em aflorar cotidianamente, somos perseguidos por “almas vivas” que nos atormentam em pesadelos de consciência, somos violentados diuturnamente por injustiças cometidas no afã do beneficio unilateral perpetradas por nossos timoneiros ou seus diligentes seguidores. Nesse caminhar “trôpego”, nesse torpor embaraçoso, a voz, embargada, violada pelas circunstâncias, teima em falar em nome dos esquecidos, dos maltratados e dos jogados na sarjeta pelo poder público.
As pequenas oportunidades de se fazer justiça com os mais pobres, com os desprovidos, ou pouco providos de recursos para o seu sustento, se apresentam a todo instante para nós que gerenciamos órgãos públicos. No entanto, as grandes oportunidades de, como se diz no jargão popular, “provocar mudanças significativas com apenas uma canetada”, são reservadas aos executores e legisladores da coisa pública. Por conseguinte, nessa vida política metamorfosica e de via dupla, os semideuses são aqueles que detêm a última palavra sobre distribuição de recursos, empregos e favores que muitas vezes interferem na sobrevivência de famílias inteiras.
Um episódio recente, nas plagas pocoverdianas, emoldura esse arremedo redatorial com pretensões filosóficas e almeja corroborar as palavras iniciais. Como cidadão nascido, criado, habitando e vivendo o dia a dia do burgo, declaradamente apaixonado pela feira semanal, na qual religiosamente, aos sábados, acordando no cantar dos galos e chilrear dos pardais que infestam nossos telhados, vivenciei a “mega-mudança” da feira para um novo e moderno mercado hortifrutigrangeiro com pretensões metropolitanas, mas, que, guardando as devidas proporções, esteticamente é uma beleza de freqüentar. Pois bem, sem mais delongas, no primeiro dia de funcionamento do nosso “CECAF”, como fazia a 20 anos no antigo local, lá estava eu, “cedinho, cedinho”, para cumprir a minha “via-crucis” de homem casado que, numa obrigação prazeirosa, tirando de lado a falta dos “vinténs” no final do mês, perambula entre as barracas de carne, frutas, verduras, requeijão, temperos etc. Primeiro, como é de costume, as carnes, e, eis que ao procurar o machante que compro carne de porco à 15 anos não o encontro. “Zanzei”, “zanzei”, por entre as bancas novíssimas, escutando o zumbindo das novas serras elétricas, vendo de forma orgulhosa as balanças digitais, me perdendo no emaranhado de frequeses que mais admiravam do que compravam e, nada de “Dito”, nada do “cortador” de carne de porco. Continuando o périplo, pergunto a um e a outro, alguns me fazem a mesma pergunta, mais ficamos todos com a mesma resposta, nada de “Dito”. Não me dei por vencido, procurei fazer uma investigação criteriosa para saber porque alguém que a 15 anos se utiliza da sua profissão para tirar o sustento de sua família, tinha, de repente, parado de exerce-la.
Pasmei ao ouvir uma série de denuncias, indagações e reclamações de alguns feirantes, advindas da forma, pouco ortodoxa e justa de distribuição dos locais, das bancas, preços, aluguéis etc. Mas, pensei, “se Cristo não agradou, nem agrada a todos, quiçá os mortais”. No entanto, naquele momento, e nos momentos vindouros, confesso que a maior preocupação era com o que estava acontecendo com o “cortador oficial de porco”. Apurei alguns fatos estarrecedores que “carecem” de uma investigação mais profunda. Pois bem, segundo alguns “machantes” e gente do meio, Dito não tinha conseguido uma banca, só quiseram dar-lhe a metade de uma para que este pagasse a metade do imposto pago pelo uso do bem público. Outros afirmavam, categoricamente que, as bancas de carne foram distribuídas de forma injusta, sendo que apenas algumas pessoas controlam a maioria das bancas e outros, que receberam o beneficio prontamente alugaram, sublocaram o bem público e agem como verdadeiros proprietários. Ou seja, “tudo continua como dantes no castelo de Abrantes”, o mercado de carnes de Poço Verde continua sendo controlado por pessoas que a muito tempo monopolizam o processo de compra, venda, abate e corte de bovinos na nossa terrinha.
Após cinco ou seis semanas da tão sonhada mudança, transferimos as mazelas teóricas e nos escondemos nas belezas de um novo e moderno edifício, mas perdemos uma oportunidade de fazer justiça com aqueles que realmente necessitam da mediação da administração pública. Assim, torno a encontrar o “cortador de porco” nas ruas da cidade e este me diz: - Na próxima feira vou esta cortando porco e metade de uma novilha, espero você e outros fregueses para mim ajudarem, pois aluguei uma banca no novo mercado. Pergunto, como? E este me responde: Aluguei uma banca por 35 reais e vou pagar mais 40 reais pelo uso aos gestores. ... Lágrimas de indignação marejaram meus olhos, ânsias de pura emoção provocaram um rebuliço interior diante da constatação inequívoca de mais uma injustiça cometida... Estão sublocando o novo mercado e, pessoas do povo, que a anos exercem sua profissão com dignidade, foram alijados do processo de distribuição de espaços.
A indignação, o torpor, o sentimento de impotência, a percepção de um mundo cruel e injusto vislumbrado nas práxis mínimas, e o desgosto se avolumando na medida em que se percebe que todos sabem, todos vivem e respiram um aroma de conciliação pernóstica enquanto nos calamos e nos tornamos iguais, cúmplices dessas injustiças porque, de certa forma, sabemos e aceitamos o que acontece. Juizes, executores, legisladores e gestores formam uma casta de beneficiados e nós, que gravitamos em torno desse sistema, como uma categoria intermediária, entre os poderes e o povo, somos amordaçados, controlados, e seremos amaldiçoados eternamente por não vivermos o momento presente, por contermos sentimentos de busca por justiça social, por negligenciarmos e escamotearmos a verdade em nome de um falso sentimento de segurança para os considerados “nossos”.
Invoco, concluindo com profundo lamento, as palavras finais da carta de Pero Vaz de Caminha, a El Rei D.. Manuel, primeira de uma nação invadida e prestes a se construir, que referenciou a prática de se fazer política em “terras brasilis”:
...E pois que, Senhor, é certo que tanto neste cargo que levo como em outra qualquer coisa que de Vosso serviço for, Vossa Alteza há de ser de mim muito bem servida, a Ela peço que, por me fazer singular mercê, mande vir da ilha de São Tomé a Jorge de Osório, meu genro -- o que d'Ela receberei em muita mercê.
Beijo as mãos de Vossa Alteza.
Deste Porto Seguro, da Vossa Ilha de Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro dia de maio de 1500.
Pero Vaz de Caminha
In: http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/carta.html

Edição de base:
Carta a El Rei D. Manuel, Dominus, São Paulo, 1963.
 
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